Após a vitória nas eleições legislativas de meio de mandato, o presidente argentino Javier Milei anunciou que sua principal prioridade será uma reforma trabalhista que prevê mudanças profundas nas leis do trabalho, incluindo o aumento da jornada de trabalho de oito para até doze horas diárias. A revisão do sistema tributário, antes prometida como foco inicial, ficará para uma segunda etapa das reformas econômicas.
O projeto, denominado Lei de Promoção de Investimentos e Emprego, foi apresentado no final de 2024 pela deputada Romina Diez, do partido Liberdade Avança, e retoma pontos do decreto de emergência trabalhista de 2023, atualmente suspenso pela Justiça. O governo argumenta que a proposta pretende formalizar cerca de oito milhões de trabalhadores informais e reduzir custos para empresas, sobretudo micro, pequenas e médias.
Entre as medidas mais relevantes estão:
- possibilidade de fracionamento das férias em períodos de, no mínimo, uma semana;
- negociação direta entre empregados e empregadores sobre banco de horas, sem necessidade de pagamento de adicionais;
- parcelamento de indenizações e multas trabalhistas em até 12 parcelas mensais para pequenas e médias empresas;
- pagamento parcial de salários com benefícios como vales-alimentação ou cestas básicas;
- incentivos fiscais para estimular contratações formais, com isenção de encargos patronais por 12 meses para microempresas e descontos proporcionais para empresas de maior porte;
- e a prioridade de acordos por produtividade ou por empresa, que poderão se sobrepor às convenções coletivas por categoria.
Em entrevista após o pleito, Milei afirmou que “não é perda de direitos” e destacou que a reforma é essencial para a futura simplificação tributária, que deve eliminar cerca de 20 impostos. O objetivo, segundo ele, é ampliar a base de arrecadação e combater a evasão fiscal sem elevar a carga sobre o setor formal.
A proposta integra um pacote de reformas estruturais que também inclui mudanças fiscais e administrativas. O governo planeja enviar os textos ao Congresso até o fim do ano, consolidando o que o presidente chama de “mudança de paradigma” na economia argentina.
Milei e o debate sobre a jornada de trabalho
Mesmo após o avanço eleitoral, o governo de Milei ainda não conta com maioria parlamentar suficiente para aprovar as reformas. A coalizão La Libertad Avanza (LLA) aumentou sua presença no Legislativo, mas continuará sem maioria em ambas as casas, segundo a Reuters.
Para garantir a aprovação, Milei precisará negociar com partidos de centro e forças regionais, especialmente o PRO, liderado pelo ex-presidente Mauricio Macri. Juntas, as duas siglas somam 104 cadeiras na Câmara dos Deputados, abaixo dos 129 votos necessários para a maioria simples.
O analista Mariano Machado, da consultoria Verisk Maplecroft, disse à Reuters que a aliança “pode ser um veículo viável, mas frágil, para a reforma”, dependendo da habilidade do presidente em administrar rivalidades internas e regionais. Já o deputado libertário Santiago Pauli defendeu que qualquer acordo deve preservar o superávit fiscal conquistado recentemente — o primeiro da Argentina em mais de uma década.
Durante seu discurso de vitória, Milei sinalizou maior abertura ao diálogo, mas analistas e opositores mantêm ceticismo. O ex-deputado Francisco Sánchez, que já integrou brevemente o governo, afirmou que é “improvável que ele ceda em temas fundamentais, como austeridade fiscal, reforma do Estado e desregulamentação econômica”.
Próximos passos e desafios
A partir de dezembro, o presidente pretende promover uma reforma ministerial para facilitar negociações no Congresso. No campo econômico, Milei planeja simplificar o sistema tributário, reduzir impostos e flexibilizar as regras trabalhistas, buscando dinamizar o mercado de trabalho argentino.
De acordo com analistas ouvidos pela Reuters, a reforma tributária tende a encontrar apoio mais amplo, enquanto as mudanças na jornada de trabalho e nas leis trabalhistas devem enfrentar maior resistência de sindicatos e parte da população.






